Wednesday, December 12, 2007
depillow-talk
Sunday, October 21, 2007
Yolanda
Estalo (felix culpa!)
Tuesday, October 16, 2007
obras de Rosa Herberta Vasconcellos Davida (exemplos)
- Estalo
- Yolanda
- Só Nós
- Politicas
- A ingrata
- As concubinas que vão para Antioquia
- Largar, lograr
- Com Ela canto
- Escadeados e formas físicas
- Danças de pulos
- A cobrança
- Aquilo que doi na vida
- Como se vem em Acapulco
- Trema
- Gatas, Aviadoras
- Equitação
- A enésima
Sunday, October 07, 2007
A ALIVIANTE LETRA
Pobres homens que nos invejam os verdes figos, e nos espreitam com candidata aleivosia pelas grades da sua velhaca apetência.
Que nos refresque e revigore em sua diurna sageza, e nos desfaça das mezquinhanças e nos reluza aos olhos daquelas que se desesperam com o oculto nas suas penhas e ladeiras.
Eis que se passou o inverno; e estou mais humana e ferverosa e perfumada e a pele ainda mais suave, ó filhas.
A macieira dá-nos a sabedoria que não abranda.
A moda é a pornografa que transmuda o excesso divino da natureza em sublimes paramentos e silvantes pensamentos.
É não é o lírio maléfico acenando aleivosamente nos campos, para que na sua contemplação nos façamos mais interiormente ardentes e exteriormente ousadas?
Apascenta o teu rebanho de carícias no banquete deleitoso do meu corpo, que tem erva boa e cheirosa e te responderá como excelso esposo.
São os bosques que buscam com sua arregalada e bem tangida harmonia a voz varoa de minha amada.
Desejo resplandecer como ouro. Mas não desejo ser ouro, nem de metalurgias solares. Pois sou como a lua que aparece e desaparece, se mingua e engrandece, se desespera e se alarga.
Pomba minha, que debicas as fendas de meus infernos.
Levou-me a moradas do mal como a uma fremosura, mas como sou sómente uma cerva que serve os matéricos deuses preferi correr para campos mais abertos e não me fechar mais em casas.
Os figos de certas amantes são estercosos pombais a que não irei jamais.
Flor gamo, que me faz chorar de perdurável desejo, flor que se desassenta e corre de encontro a fermosuras maiores.
Dizem que a natureza é confesso esterco, mas quem não escuta as harmonias que se desprendem dos arvoredos é porque não se livra das enegrecentes roupas que obstroem a alma, que se quer ainda mais corpórea e desnuda, quer no espírito, quer na alíviante letra.
Friday, October 05, 2007
AS VINHAS DA HORA
Às senhoras muito presentes, para usar comigo em meu paladar.
Ela levou-me às suas vinhas e eu abri-lhe o meu lagar.
Ela vem saltando sobre os montes, pulando como uma donzela a fazer-se cabrita, e por onde passa deixa o seu aroma, como uma chuva de flechas amorosas.
Levanta-te, meu amor, formosa ninfa minha, monstra risonha – os deuses despem-se para te ver, e os teus passos fazem o mundo mais amável.
Coroas os aspectos do que te envolve e os olhos daqueles que se gastam em gostanças, e despachas a mezquinhês e há vides em flor e as gazelas e as cervas do campo esticam-se no teatro absoluto da natura.
A minha amada é a minha amada por entre os braços dos bosques que a apertam e quase estrangulam embora seja uma flor abraçável só em delicadeza.
Conjuro-vos, ó filhas especiosas, tal é minha amada por entre as ninfas que conduzem os homens a desesperantes ravinas.
Errom como zebras feridas pelos becos e cais da moda.
Sabes por certo que aí é o bosque, e aí desaperta-se o meu amor, e até da rola se ouvem os gemidos suaves do acasalamento, e sentimos que esta é a nossa terra, onde as forças se retemperam no se desperdiçarem.
Aparecem as flores fendendo a sombra, e debaixo dela me assento mui corpórea e te aguardo com olhos de veada.
Leva-me de casa aos indómitos banquetes, mesmo que nestes se digam ausentes as iguarias, leva-me porque me banqueteie de ir só contigo.
Possa a natureza ajudar os frutos a adoçarem-se em meu paladar. E és suave quande se te acercam as loiças, e os talheres te roçam os lábios e eu me gostaria de ser a sopa que tu provas sem hesitações.
A minha amada é minha, e vem-se.
Erro pela mundanal ordem das excepções.
Pecados verdes, mundo de pelos, estábulo de deuses.
Pomba minha que com as mãos me vestes de um pudor que superlativamente se desfaz.
E debaixo dela me assento, ante olhos velozes e sob os ardentes montes do meu amor.
Formosa minha, vem, faze-te semelhante às cervas do campo desenrolando-te na cama dos arbustos e ainda mais selvagem sobre a minha floresta.
Não acordes com mãos secas. Humedece-me e a aparelha e apruma o teu instrumento afinando-me para as tuas instruções silenciosas.
CESÁRIA, A CORSÁRIA
Reluz, viscosamente, o rio. Hotéis contemplam os nativos e recontam a glória graças às mais femininas potências & também contemplam as fremusuras das outras namoradas. Vão como nenhumas, bem proporcionadas, pelos tapetes mundanos das sábias carnes!
Daqui por favor profano aperfeiçoei afeiçoadamente a cúspide da gloria e com estas deleitações (porque eu o entendo e o confesso da minha mui finita misericórdia) não deixo as coisas desanimarem com os trabalhos da carne para que me nasci. Todos os males me ajudam a dar graças aos assenhoramentos do corpo. Todo siso também. Ca os nossos passos, que aparelham o senhor corpo (ou a senhora carne) e aaqueles outros, também estultecem, no tanto se ousarem e usarem.
Entendo e confesso que o ânimo deles toma aos homens o poder, o que é motivo de motivos de não desanimarem com as ganas floridas da natureza humana, que esta ajuda ao extase. Que estes nom som feitos com deleitações sem proveito e assai parecemos dignos e mais dignos e merecedores de emoções retumbantes que podem devir nas florestas fluídas das naturas.
Porque não há nenhumas reticências que refreiem as caças amorosas, nem casas sonoras feitas com mãos alheias, e delas as forças e o ânimo e a mezquindade reverbam ante os olhos da moda e o Verbo aparentado do que se encarna.
Sabe por certo a sabor de favor amoroso, e por outro lado ao daqueles que gostarom da dulçura dos caules vigorosos, com o tinido de louças ajudando a furores musicalmente profanos.
Caímos imundas num estilo cuja híbridez nos desafora!
Daqui vamos por um ir com os que gostarom a dulçura dos bens riancheiros, motéis da moda onde podemos com que quiseramos dormir anos inteiros.
Nossos paaços, resplandecentes como ouro, e feitos com os espiritos exuberantes, coroam em esta falsa gloria, em que nos leixamos estendidos com a pele a seduzir a inclemente luz solar.
E com trabalhos ainda que duvidosos da vida vamo-nos nas andanças neste mundo e pensamos que avemos talheres para petiscar a glória.
Flamejam e reluzem as viscosas fremusuras das moradas da carne.
Os deuses tremem per aaqueles que os amam. E é por isso que saam grandes.
Em caminhada nos amam. E, assi com suas blandezas e dulçuras grandes e lúbrica misericórdia. Apesar de todos os vícios que sacodem a vida.
Semelham-se a gaiolas, ao esterco, aos olhos daqueles que nesta vida agitam as canseiras. Fazem-nos creer que sejamos sarcásticos sandeus, bem assi e muito asnos e alquímicos como ouro, e as nossas vestiduras simbólicas, de gregos vermelhos leões.
Deuses embriagantes podeis usar comigo das louças e dos talheres com fúria devoradora.
Flamejam e reluzem como ouro as nossas vestiduras, que andamos neste mundo e pensamos nele e nascemos novamente para todos os males embora não no possa a natureza fedorenta. E mais divina parece a dulçura que grande empequenece.
Vão em tremores os deuses e aaqueles que os amam.
Apesar deles me nasceram todos os males com estas aproveitáveis deleitações, como todolos seres dos arredores para uma glória inda mais intensa.
Não desanimem os que sobrepojam todo siso nem os que molham seu aparelho nos rios vinhosos do riso.
Ca aqueles que contemplam as fremusuras me ajudem a dar graças aos vaidopsos prados, aos chinfrinosos tinidos de louças e e às vestiduras feitas com as musas das modas.
Veste as mais fulminantes vestiduras, nobres e fremosas, mais excessivas que as deleitações sem proveito. Veste-as como um poder escorreito de ganas descritivas!
Com estas carnes apuradas e saltitantes parecemos viscosas, mas temos o coraçom puro e vazio e brilhante.
O rio apressa as obreiras, o visco socega os ociosos.
Como estes pobres omëes perecem muito mais que nós, embora vagarosamente verdes no seu sexo badalante!
Pois andamos perduravees com enganos e com os omëes que se pulam no criancismo: é coisa que amadurece como um escarnho azul nas nossas sentenças destemperadas.
Aqueles que contemplam as fremusuras fazem-se fremosos como as modas mais extremadas da natura.
Camas afáveis por favor divino, e por outro esse favor vindo da terra que te contempla como fremusuras habitável, como moda tangível e mensageira, e silva de choros e de tristezas vestidas e de alegrias desnudas. Causas nobres e fremosas? Ou mais fedorentas que lagrimas e mais perversas que choros, e mais feas que ceo tempestuoso? Que nom som feitas com mais do que nós, que andamos neste mundo a dar graças aos deuses de alto brilho, mas participamos na sua comédia comedida e lhes oferecemos em sacrificio o espetáculo da plenitude por muito que pareçam as coisas seeram conrompidas.
O sabor sábio do desfavor.
Caminha, cisma e olha. E assim correrá muito bem. As congratulações finais. A mulher que já não sua na brusquidão de se apossar dos utensilios domésticos mas que se deita na imensidão do presente.
Algo lhes enformava as vidas & a gola do sobretudo e as não vidas num sem sobressalto, num sobretudo alto: sem a afabilidade gelada dos canos no inverno desliza pelo interior algo escorreito e inquietante e dizem que é seguro e sereno. Não lhe posso tomar o peito a peito. Não lhe posso pôr os cornos em redor.
Enfias a cara na água como se lhe quisesses pertencer e mergulhas com ela a mão. Cada um e o tudo num sem sobressalto: sem afabilidade há passagens de mão a mão. De carácter a carácter.
Cada espelho sem destemperos nos ama.
Sem favor, apaixonada, em todos passos que não se ouvem, ela chega como uma dama inusitada e branca. Não ama a convivialidade e convida à delação. De madrugada torna-se mais àspera e esguia.
Estava uma noite quente e havia um bafo a acompanhar-lhe o ar sem aragem. Na alma, um mínimo limpava os excessos e os restos. Os outros impacientavam-na, e ela se ria, lembrando-se da mulher que saíra da mais terrena terra. Como é ainda afivelada a teorias antigas! O seu sangue sobe aos convés das almas.
Sabes o que fazer? Reconhece, nas vibrissas, os momentos peludos que têm asas. Queima os cadernos de encargos. Reduz-te exactamente.
Uma carreira temível, estimavel, informada a medos.
E ele, onde chegara, chegara sem chuva. Levantou-se para os que ouviam. Não há vivalma, ouve-se menos através daquela gente. Para aparar a noite como uma sebe estrelada.
Escolhidas pelo que têm, não pelo que o espelho da emanação dá a espelhar.
O espelho enche a concha a medo, arredia-se à convivialidade e não dá ouvidos.
Não há amigos desfavorecidos pelos anos, só amigas desvirgindadas pelo ânus.
Da terra, como sumptuários já arrumados mais alto em lugares públicos, passeando, fixa a cara.
Um rubor de pedra sobe às espáduas. Olha-se, vê-se. Aquela gente a impavidar-se numa vidência àspera. Ao seu sinal os bafos acompanham-lhe a serenidade do olhar. Na boca arremeda-o um esgar, como uma flor vibrátil dessa espécie negra, dessa variante obscura.
O homem-esgar tenta reaver a lassidão da pele num sem sobressalto.
Sem afabilidade sente a testa de ferro: à disposição, como fáceis folhas cadentes.
Assim que pensa, pondera, pendura, convida a acompanharem-lhe a cabeça.
Passa a limpo notas e rabiscos, como se o dia estivesse acabado. Próxima desatenção: as guias finas brilham auscultando o sereno aspecto que lhe convem.
Punhos aos pulsos. Punhetas às pulsões. O arrepio das vidas num sem sobressalto: mutismo.
A noite exactamente nocturna, sem a farsa burguesa da luz elétrica. Uma carreira temível, escolhida, satisfeita consigo, conivente com ela até à medula ia-se numa despedida pouco amorosa.
Conseguir, era resultar nela o que vibra, ferver o frio e o cauto numa alquimia carnavalesca. Igual sempre que for dessa espécie, dessa variante. Era a brusquidão que lhe enformava a soltura.
A avaliação demitia os aspectos, consigo, a sós, em conivencia com o afecto coarctado. Temido e solto. Não fez som, mas sobressalto: sem afabilidade e sem destemperos. Sem gente pastável para seguir de cada um o tudo e o nunca que quisera ter. Objectos que afivelavam presenças.
O sangue sobe ao estímulo, colocando as feições pelo seu registo. Aprendera a ser solta. A avaliação era um bem naquele rosto que estímulava o frio. Rebuçava em anos. Da terra, como o lajedo do grande átrio aberto, dos punhos aos pulsos, so sexo à lingua.
O arrepio tinham-se alevantado, com apetrechos sumptuários e rabiscos, com o timbre sem chuva.
Levantou a gola do sobretudo e de tudo o que afagava o seu registo. Aguentou-se afugentando sentidos únivocos.
Aprendera, no risco, e não dera fraqueza.
Quando se apropria sem noticiar-se, a noite reverbera-se sem chegar a porquês. Amargam-se as variantes mais amáveis. Os agradecidos da sua brusquidão, que lhes enformava o que fazer multiplicam-se para si.
Reconheceu, tinha vida própria sem noticiar-se, de águas frias e tintas fluídas. Passou à próxima intriga, aos vapores da cobiça e aos pós do cinzel. Nada mudou, não consumira ninguém num fogo azedo de azoto. Há muito de afazeres, com ou sem destemperos. Sem favor, nem desfavor. Porquê, o afecto, todo ao longe?
A reunião correra bem. Mas dava-se um ar sem aragem. Aprendera, há muito, com o lúgubre. Deixara os deveres oficinais para seguir as caminhadas da noite. A bela afeição a uma torre que sai do solo. Como a noite estava de uma grande frialdade (ao menos para aquela gente) ela sentia-se um vulcão oracular.
É assim que ela pensa, pondera, vê, aguardando a esferográfica sibilina posta a dançar uma coreografia muluscolar.
Os afectos invectivam a novos finais. A repugnância senhoreia.
Diante do passagens de mão arrastava partes da cara. Cada invectiva era um resolver contra alguém. E soerguia-se na sarjeta próxima. Segurando a serenidade.
Em momentos de risco, não dava fraqueza. Desejo de alargar a alma, no mínimo. Uma guinada na memória afastava-a e deslizava-a pelo interior dos punhos da intriga.
A reunião da cobiça e da intriga apaixonada em exímios passos não se basta a acompanhar-lhe a cabeça.
Os ombros, arremeda-os com esses olhos de balneários, de sanitários de liceu e pele enxuta. Penteia-se, acha-se bem naquele rosto anatómicamente de Gray ao invés. Lição de impassibilidade e mutismo.
Como se ria? Lembrando-se onde guardara a esferográfica. Lei da selva? Exactamente.
O trabalho não era conseguir, era resultar, e comungar com uma donzela puxando-lhe as rédeas soltas. Retirava, sem desejo as ofegações do peito e afastava-se do espelho.
Da emanação dos balneários, dos sanitários sem afabilidade e sem destemperos viera-lhe a canibalidade. Sem favor, sem chuva. Levantou a gola das intrigas alheias e sentiu uma outra coleira.
Um rubor de pedra subiu-nos à paixão. Ao menos para aquela gente um sermão é um sermão. A sua marca fazia enormes as mulheres. Para todo lado iam satisfeitas consigo, coniventes com ela. Estava inacabada. Ao menos para os escalões. Aquela gente não tinha vida porque a quisera ter tão depressa.
Objectos que não da memória afastam-na do espelho com sagacidade.
Da terra. Da terra, dissera-lhe o amigo. Um rubor de pedra nos malares. Tinham-se levantado em segundos para aparar a noite. A noite estava guarnecida de esferográficas.
Aragem. Retoma o o alívio. A reunião dá medo, arremeda a convivialidade e dá folga à terra. Da figura no espelho funcionários menores levantaram-se afivelados. O sangue sabia ao estímulo dos passos que não se ouvem. Não encolhe os ombros, arremeda-se num esgar satisfeito consigo.
Conivente com eles até ao risco, não dá a cara à decifração porque não tem decifração possível .
Ainda há virgens nas notas e rabiscos, como reconhece finalmente.
Objectos fitam o lajedo do grande átrio sem destemperos.
Sem favor, num esgar a reaver antigas doçuras dissera-lhe o amigo «há tantas esferográficas postas à disposição, as duns e as dos outros, e a sua». A do frio? Remoça em segundos para aparar a gola do disposição... As folhas não o confirmam.
As quatro virgens de cobiça e da intriga apaixonam em escalões. Aquela gente não tinha vida.
É grande avondança em esta falsa gloria da moda.
Sabe a vida aqueles que contemplam e recontam e voltam a contemplaR as fremusuras das moradas dos motivos.
As forças e o ânimo apressam-se ou apresam-se.
As obreiras nas oficinas descontam a gloria perduravel e a sua face graciosa.
Monday, October 01, 2007
o surrealismo depois da morte
Friday, August 31, 2007
corrupções linguarudas
queixava-se inocentemente um cronista das corrupções da linguagem, bem escrita, bem falada, ou mal escrita, mal conjugada, esquecendo-se ele, como muitos outros do género que todos os dias se arrepiam com os desarranjos da linguagem (como os Gatos Fedorentos) que esta, qualquer que seja é espampanante corrupção
o policiamento da linguagem não é recente, e os latinistas, e cada vez mais as autoridades estatais, andam para aqui a «normalizar» a lingua a bem de uma comunicação decente, sem equívocos,
é certo que um babelismo generalizado é indesejável, mas contentemo-nos com as corrupções de linguagem que se fazem banais, venham ou não a pretexto de retorcidos sentidos ou de politiquices balofas, e saúdemos as literárias que cozinharam Camões ou Guimarães Rosa e todos aqueles que adaptam, traduzem, erram, achincalham, trocadilham, enriquecendo corruptamente a lingua
p.s.
escrevemos (citamo-nos) no post anterior, que «quando nos vemos ao espelho pensamos logo no Prado Coelho» - falar de Prado Coelho é falar de citação e especulação, de arranjos cortêses, de uma imagem em que nos revemos e pensamos como nos damos a ver
o desaparecimento do Prado Coelho é a ausentação de um tom mediático que ao longo dos anos cada vez mais se fazia em função das modas dos poderes, com algum lirismo estratégico, com colagens e descolagens rápidas a teorias, modas e politiquices - os seus Universos da Crítica prometiam no ínicio dos anos 80 uma radicalidade (é certo datada) algo mais borbulhante - EPC foi para nós uma decepção teórica porque esperamos demais dele, mas EPC também nos envergonhava no lê-lo quando poetava - o seu lirismo, tal como o do Lobo Antunes, roçava muito o kitsch, imitação babosa de nobres modelos
mas o pior é a ausencia de sucessores do género, e é pena que se faça um maior vazio na especulação destas questões caseiras entrançadas com as actualidades do mundo teórico, francófonas e mais além,
perdeu-se o ícone do intelectual cá da terrinha - as más linguas calaram-se e elogiam-no gordurosamente, como em todas funeralhadas
homenagear EPC é contuinar a ir frivolamente e profundamente para a cama com a actualidade, com a moda, com ou sem nostalgias de Barthes ou corruptos trocadilhos lacanianos, e com incomformismo e sensatez política (ao mesmo tempo, sim senhor!)
num país onde todos se calam no dizer o que vai na cultura, nas artes, EPC foi um vísivel lutador,
e é por essa razão que nós vamos continuar a cochicar, a achincalhar, a falar do que se teme falar: bem, mal, amável, polémicamente dos que mais gostamos, e sumáriamente do que nos desinteressa
Wednesday, August 15, 2007
OBRAS & SOBRAS
Ler Marguerite Duras
É pior do que beber aguarrás
Era uma vez uma menina
que era um rapaz
quando nos fomos ver ao espelho
pensamos logo no Prado Coelho
feminismo no cacém
já não interessa a ninguém
estivemos 20 anos à espera
desta eterna primavera
os melhores versos
andam p'raí dispersos
a uma mulher sózinha não se trinca nem a espinha
a duas mulheres unidas não se furam as barrigas
ADIVERTIMENTO
Não foi uma tarde, mas uma eternidade…
Somos duas há muito tempo como se fossemos uma só. Sei que isto custa a acreditar, como custa tudo o mais. Estivemos a amadurecer sentadas nos nossos desejos e escrevemos cartas de amor para encurtar as distâncias. Chegamos a um tom , a um estilo, isto é, a uma solidão desinteresseira. Escrever não é um acto a quatro mãos, mas pode muito bem ser a quatro patas. O amor que nutriamos uma pela outra acabou em inacreditável onanismo. Só agora percebemos que a escrita nos desenvencilha da triste tagarelice a que nos condenaramos. Ainda para mais hoje, em que o amadurecimento nos obriga a pintar os cabelos mas nos proíbe de pintar as unhas. E tu, leitora loura que nos lês com os pés assentes no chão , não te assustes com o que escrevemos. Mas pensa bem, Em cada homem há um inalterável cabrão que te abusará do corpo e passados os trinta e picos te abandorá por uma secretária ordinária. Trata-lhe da saúde ò filha!
Uma obra é uma obra
Filhos são sobras
«Sei de sobra
que nunca terei uma obra»
Fernando Pessoa
1
Não há nada como comer azeitonas numa banheira, a duas, ao fim do dia.
2
Descascar cebolas como quem faz uma coisa arrepiada
Sublime
Eu descasco de gatas
Como se escrevesse uma canção de amigo
Ai cascas de velha cebola
Sou sábia, incerta, ou tola?
Que na vida só se chega a bôla
Ai Ada, ai Ada
Qu'é da minha empanada?
Vai-se-me a vida com os ardores
Dos fogos que ardem como amor
Do fogo não fica a cinza
Só o bolor
E é melhor que não me casem
Porque toda eu sou súor
Ai Ada, Ai Ada
Estou tão estafada?
3
Eu era toda tremeliques. Gostava de acampamentos
Cheios de moças friques
E à noite à lareira
Sentia alguma ciumeira.
Também gostava de cheirar
As cuecas a secar.
4
Lídia, se fores à janela
Manda um beijo à Célia
Que é tão bela.
5
Tenho o Vazio a encher-me
O corpo em todas as partes.
Há quem tenha infinito a mais
Na cabeça ou no olho do cú.
Eu tenho infinito a menos.
O veneno és tu.
6
Helena de Troia era tão fascinante
Quanto uma giboia.
Suspeito que algures na Amazónia
Helena devora gringos míopes
Com a sua boca-sexo
Entre araras e papa-formigas.
7
A natureza maquilha-se todos os dias
Não é òbvia como o pau estendido de um homem
A espera que uma mosca lhe poise em cima
E o cague.
8
A ti que só vias partes sem tudo e guardavas rebanhos
O que é que posso dizer?
Que vejo tudo sem partes.
Que tomo banhos e cuido das banhas.
9
Não entendo como é que uma virgem
Ainda por cima Maria
Conseguiria
Parir um menino Jesus.
Mas consigo perceber perfeitamente
Como é que um gajo chamado Jesus
Consegue parir
Por antecipação
Uma mãe de estimação.
10
Pús as minhas memórias todas no prego.
Rendas, joias de familia, a máquina fotográfica do tio…
As fotografias vendi-as na feira
Da ladra.
Cartas também de amor
Queimei-as no fogão
Ou limpei a menstruação.
A vida, no particular foi-se embora aos poucos.
A outra, a em geral, também já cá não está.
Fica-me este concreto a metro.
11
A inadequação dos machos ao que está à volta se não é total é brutal. E no caso de não serem eles os autênticos extraterrestres só posso concluír que extraterrestre é a natureza. Provas cientificas não faltarão.
12
Gosto da minha periferia
E da cosmética barata.
Do chá de camomila
E das garrafas de vodka.
Tenho nostalgia dos tempos
Em que as mulheres usavam combinação.
Agora andam descombinadas.
Ai Madre Teresa!
Tuesday, August 14, 2007
variações wittgensteinianas de Rosa Davida
OU VARIANTES QUE DÃO ADEQUADO TRATO
AO TRATADO DO SR. L. W.
POR ROSA DAVIDA
(escritos neste 14 de Agosto de 2007 em cima de uns guardanapos)
O mundo é um caso
O mundo é tudo o que m-amamos.
O mundo é o que se mama.
O mundo é tudo o que se casa.
O mundo é tudo o que vem à baila.
O mundo é a actualidade dos fa(c)tos e dos afectos.
O mundo é a transição das modas.
O mundo é a inclinação dos desejos.
O mundo é a transcrição meticulosa da coscovilhice.
As coisas são o como se amanham.
As coisas são as compras que fazemos e as inutilidades de que nos desfazemos.
O que vem à baila é a desarrumação das casas do mundo.
A arrumação/desarrumação é o que ajunta e afasta as coisas, e as torna apropriadas ou propícias.
O mais importante é sabermos em que sítio é que estão exactamente as coisas.
No arrumo da Casa do Mundo o lugar das coisas não é um lugar qualquer – cada disposição torna mais ou menos especial os restantes lugares que com esta se relacionam.
As coisas fora do seu sítio tornam o mundo desleixado.
A evidência do caixote-do-lixo torna muitas coisas dispensáveis (ou recicláveis).
As coisas servem para fazer coisas, para dar uma certa beleza ao que se passa na passerele do mundo, ou para nos entre-termos com elas.
Pensar em «todas as coisas» ( e ao mesmo tempo?) é um disparate que só ocorre a quem não pensa em todas as coisas como deve de sêr - «todas as coisas» é uma ideia indefenida para agrupar a partir do quanto (pouco) se sabe e tentar adivinhar «abstractamente», num golpe de bluff, o «resto».
Cada arrumação inclina-se para muitas possibilidades de outras arrumações.
Arrumo e asseio de linguagem fazem-nos mais entendiveis e comunicantes.
O asseio de linguagem faz parte de um asseio geral que torna tudo mais belo, apetecível e convivial.
Os casos são as ligações que decidem as coisas, mesmo quando são dúbios.
Um caso é o que põe em movimento de resolução a degradação das relações.
A aparência é um efeito do «realidade» e o principio da inveja.
A (boa) aparência devolve aos objectos a sua «bondade» potêncial.
As aparências tornam os diversos aspectos da realidade conectáveis (e colectáveis) – chegam assim às pessoas mais rigorosas/vigorosas.
As aparências implicam uma soma curcovilhante de suspeitas.
A veracidade ou falsidade das aparências não dá garantia de que algo seja difamável.
Uma aparência é um convite para «uma certa lógica».
A veracidade ou falsidade das aparências não dá garantias de que algo seja logo difamável.
Uma aparência é um convite para aprimorar uma lógica.
A veracidade das lógicas das aparências depende da veracidade das relações que nos são facultadas.
A conversa (interna/externa) sobre a aparência lógica das relações é o pensamento.
Aos conjuntos de pensamentos que imbrincando uns nos outros nos dão a sensação de que algo é verdadeiro chamamos mundaneidade.
Nem tudo o que pensamos é consequente ou possível.
Podemos pensar coisas muito «ilógicas» (como os temas mitológicos) mas não lhe damos uma atenção prática por aí além.
Um pensamento correcto deve ter em conta não só a necessidade de o exprimir como os incómodos ou prazeres que possa provocar.
A ambiguidade das palavras pode gerar equívocos filosóficos quando se usa uma lógica pobre, mas faz riquíssimas insinuações se usarmos uma lógica enriquecida.
As confusões que surgem fazem parte do adiamento do desfecho do drama – o interesse dos fa(c)tos deve-se a um bom tratamento telenoveleiro.
Quase todas as observações acabam por dizer algo de si próprias, tal como a roupa que vestimos índicia comportamentos e apetências.
O pensamento é um conjunto de observações pertinentes que nos dão dicas (cartografáveis) para nos orientarmos na vida.
O que torna essas dicas pertinentes é o uso da linguagem e os comportamentos adjacentes.
As linguagens que construímos são estratégias de arrumação das coisas através de redes hierarquizanteas de palavras.
Uma insinuação é um ataque à estabilidade da aparência da «realidade».
Temos, regra geral, mais em conta os nossos convictos modos de arrumação do que os de qualquer amiga ou vizinha.
Uma construção lógica leva-nos com mais entusiasmo a onde já estavamos determinadas a ir.
Uma insinuação comunica mais sentidos do que aqueles que pusemos nela.
Uma insinuação propõe a existência dissimulada de «outras aparências das coisas».
A tarefa da filosofia é a da depilar a verdade antes desta se mostrar nua.
O impensável é o que é impossível de pensar, mas o «impensável», segundo o muso comum, é o que mais acontece.
Há coisas que não sabemos expressar e para as quais algo chamado intuição parece acenar – é o «intrigante» indizível.
Tudo o que é pensável pode ser feito com simplicidade e limpeza, por isso muita porcaria e complicação hão-de vir ao cimo.
O que acaba por ser demonstrado é frequentemente o que se andava a dizer pela calada.
Uma proposição é o que dá conta de uma série de propósitos e de alguns despropósitos.
Um nexo de causas é uma suspeita que se adensa.
O livre arbítrio é a liberdade que gozamos cá com os nossos botões de nos dizermos o que quisermos e de imaginarmos o que desejamos.
A fatalidade é o saldo para os outros de uma vida no preciso momento que vamos desta para melhor.
Uma tautologia é o que nos repetimos para nos convencermos de uma certa coisa com argumentos cada vez mais refinados.
A filosofia é uma psicologia minimalista com o preconceito de ser psicologia e que dá um ar de tratar soberanamente da arrumação definitiva do mundo.
A filosofia parece que anda a des-implicar as criaturas dos seus pensamentos mais humanos (dos arrumos e desarrumos da «existência») substituindo-os por implicações aparentemente menos singulares e mais vastas.
Uma suposição é o resultado de muita coisa que se foi dando conta.
Sabemos que o sol nascerá amanhã, estejemos vivas ou mortas, ainda que alguma lógica nos tente convencer do contrário. É o triunfo impiedoso do senso comum.
Existem mais necessidades metamórficas do que lógicas – as coisas estão em metamorfose permanente e a lógica tenta fintar o metamórfico depurando-o de todas as suas inclinações e postulando alguma essência aqui e acolá.
O mundo está dependente de muitas vontades ao mesmo tempo.
A cada morte o mundo passa a ser uma disputada herança.
Há proposições cujo efeito é bem mais devastador do que outras.
O sentido do mundo acompanha-nos sempre no mundo – se o sentido estivesse fora do mundo, o mundo seria destituído de sentido.
Um sentido é sempre na imanência – só é sentido o que se sente.
Caso haja algo parecido com divindade esta só pode ser a consciência na imanência.
A nossa vida é tão variada que o infinito só nela tem sentido como uma metáfora derivada de jogos matemáticos.
O enigma persiste como uma pergunta que ainda não está bem formulada.
A questão que se coloca é se podemos formular mesmo «bem» uma adequada pergunta alguma vez.
O enigma é apenas o sentimento de inadequação e de in-formulado.
O cepticismo é a honesta desconfiança quanto a um diagnóstico sempre certeiro baseado em lógicas ou filosofias.
O cepticismo é um diagnóstico reservado e cauteloso.
Sobre o que ignoramos nada podemos asseverar.
Sobre o que deviamos estar caladas apetece-nos fazer insinuações.
Thursday, August 09, 2007
vimo-nos gregas
Saturday, August 04, 2007
da necessidade da «usura»
Tuesday, July 31, 2007
ai o conceito é tão metonímico
show job
suma patológica
Monday, July 30, 2007
a vida da Rosa Davida e par aí fora
- Criada entre criadas, davidei-me nas iguarias que se me foram oferecendo. Fiz-me moça muito almoçando e robusteci as minhas formas sem chegar a gordura para além de fermosura. Perdi muitas oportunidades de especialidades que pudera cultivar. Bailei muito i. E mais bailei muito i enquanto os outros e as outras arengavam seus labores nas praças.
- Iam-se os dias para diários, limpavam-se e desossavam-se na escrita, ficando límpidos, nítidos e gregos à sua maneira, se bem que esta maneira grega fosse praticavel e pouco auroral.
- Aprendi a conviver com os meus membros e registei os esbracejamentes como calamidades passadas. Admirava a gestualidade musculada da Calamity Jane na interpretação da Doris Day, mas não punha em causa o meu talento conformado pelo ponto-cruz, embora me entediasse de morte nas tardes em que as tias solteiras me obrigavam a tapetes-d'arraiolar.
- Era boazinha, um bocadito boazuda, forte de espirito, recatada quanto baste, dada a inocentes gargalhadas insolentes e comentários estapafurdios aos pequenos-almoços, e bocejos pouco depois dos jantares. Não dei aso a preocupações, mas dei asas a secretas ocupações.
- Falava e até gritava com os meus botões. Queria-me artista desde logo, antes inda das insolências das adolescências. Pintava (ou garatujava) sobre os cromos dos asnos dos meus irmãos que se beijavam uns aos outros em longos linguados. Eu preferia patas de peluches. Ai deus i u é.
a ameaça da madrasta
a pátria deles
almada, os outros, as outras, com, contra e etc.
Monday, July 16, 2007
sobre a Rosa Davida
Uma Rosa é uma Rosa é uma Rosa & a Vida é a Vida é a Vida
Não há Rosa sem senão.
Davida é Rosa em roupão.
Ensaios em saias
1.Davida complexa
2.Davida sentimental
3.Davida sexual
4. Davida depois Davida
5. Davida mais ao menos
6. Davida dividida
Friday, July 13, 2007
safando-nos de safo
Ah! Quantos tormentos dão pasto de chamas ao meu coração! E o que é este desejo de me fazer perdida? Porque é que busco novas ligações amorosas? "Quem ousaria ofender-te ò Safo! Se hoje te fujires, amanhã te farás buscada; se ela se recusa e a teus dons se esquiva, cedo se oferecerá de bandeja, se hoje se enoja amanhã procurar-te-á com redobradas ganas, mesmo que o não queiras!” Vem, vem, desde agora, ò deusa, emergir-me nesta selva cruel de tormentos! Que os desejos acampem em meu coração!
Não me recuses o teu diligente socorro! Pareces-me igual aos deuses, quando em teu redor sentada, devagar, escuto doces palavras e acolho o teu sorriso incendiário. Eis o que me perturba até ao fundo do peito. Mal te ponho os olhos erm cima, a voz não acompanha meus lábios, a língua desata-se, uma chama subtil corre em todas as veias, as minhas orelhas sentem o tremor, um suor frio inunda-me, o meu corpo freme, fico mais pálida que a erva desvanecida, a respiração esgota-se, e parece que estou perto de expirar. Mas é necessário ousar dado que a necessidade é bem maior que a criatura...
Todas as companheiras cortaram corajosamente os belíssimos cabelos sobre o seu túmulo.
Se Zeus quisesse dar uma rainha às flores, a rosa seria a rainha de todas as flores. Continua o ornamento da terra,a mais bela das plantas, a menina dos olhos das flores, o esmalte dos prados, beleza suave e incontestável: exala o amor, atrai e fixa Afrodite: todas as folhas são charmosas; o seu botão avermelha e entreabre com uma graça infinita e sorri déliciosamente aos amorosos Zéfiros.
Inclemente é o caminho da posteridade.
Sombras não aquecem nem recordam sombras.
Vem às nossas deliciosas refeições, mãe do Amor, vem preencher de um néctar agradável a nossa dourada corte; que a tua presença faça nascer a alegria no meio dos teus convivas e dos meus.
O amor vencedor dos obstáculos perturba-me e agita-me. É um pássaro suave e cruel; a ele não me sei opor.
Atis, é-me agora ignóbil – seus quereres voltaram-se para a bela Andromeda.
A lua e Pléiades estão deitadas: a noite dispôs já metade do seu curso, e eu, infeliz, estou só na minha cama, acabrunhada em tristezas...
Ò minha terna mãe, não posso, infelizmente afadigar-me em lavores de donzela: a temível Vénus subjugou-me imperiosa, e o meu violento amor para com esta jovem ocupa-me inteiramente. Como é que esta mulher grosseira e sem arte pode encantar o meu espírito e amarrar meu coração? Não sabe mesmo deixar flutuar a graça e os panejamentos dos finjimentos!
Luto e lágrimas não devem grassar nas casas do poeta: é uma fraqueza indigna dos servidores de Apollon.
A criatura que é sómente bela, é-a apenas por um dado tempo. Olha-se-a e pronto. Mas a criatura sábia e boa é inacabadamente bela.
Para mim, que gosto de uma vida frívola e voluptuosa este amor e seus prazeres presentes não me impedem de fazer acções brilhantes e honestas. Não sou de um carácter impetuoso e fervilhante. O meu espírito pelo contrário é tranquilo e calmo. As riquezas sem a virtude não se safam de censuras; mas desdenhar da virtude e as riquezas, aí está o cúmulo da felicidade.
O ouro é filho de Jupiter, não oxida, nem os vermes corroem este metal, que fascina caprichosamente os mortais.
Noivos felizes: vosso casamento realiza a vontade de antigos desejos. Possuam-se as jovens belezas que se desejam! Arquitectos, dai mais elevação a estas portas, porque o noivo que avança é semelhante ao deus da guerra: eleva-se mais que o maior dos grandes. Ajuntai-vos todos, e oferecei libações fazendo votos de felicidade aos noivos. Nunca uma rapariga numa hora assim foi tão extrema em beleza.
Crepusculo, trazes contigo todas as felicidades: és a hora em que a terra se deixa abraçar pelo olhar ligeiro, encaminhas os rebanhos maternamente. Crepusculo, reúnes todos os seres que a Aurora com sua luz dispersou.
Virgindade, virgindade, para onde te foste quando me abandonaste?
A ti não voltarei, não voltarei jamais!
Vinde aqui Musas, derramai a vossa luz!
Vinde agora, Graças delicadas, e vocês Musas de resplandecente cabeleira...
Vinde castes Graças aos braços de rosa, vinde, filhas de Zeus! ...
Alaúde divino, responde os meus desejo, torna-se harmonioso! ...
É ti, Calliope... Os desdéns esticam-te a corda e espicaçam-me a verve.
O amor agita o meu coração como o vento agitou as folhas dos carvalhos sobre as montanhas...
Voaria sobre o cume elevado das tuas montanhas e lançar-me-ia entre os teus braços, para que teus suspiros me ensadeçam...
Inflamas-me... esqueces-te da minha inteireza trágica. Gostas das outras como se pusesses o inesquecível numa prateleira.
Põe coroas de rosas sobre os teus bonitos cabelos; caminha com os dedos delicados a estrada rodeada de ciúmes...
A bela jovem que se atulha de flores parece ainda mais graciosa.
As vítimas ornadas de flores são agradáveis aos deuses, desprezando todas as que não se deixam entronar pelas grinaldas...
Vou cantar agora arias melodiosas que farão destemidas as minhas amantes.
O roxinol anuncia a primavera pelos seus aveludados sons...
Várias grinaldas e várias coroas de flores cercavam o seu pescoço...
O Amor é filho da terra e do céu...
A Persuasão é venal rapariga...
Congratula-te, jovem esposa: congratula-te, noivo invejável!...
Amigo, têm no que diz respeito a mim; que os vossos olhos brilham de qualquer seu fogo e qualquer sua graça...
A água fresca de um riacho murmura devagar sob os ramos destes pomares...
Dormi deliciosamente este meu sono nos braços da adortável Citéria...
O barulho das fodas nas folhas agitadas dissipou o meu sono...
Os seus cantos eram muito mais suaves que o som da lira, e eram bem mais preciosos que o ouro mais puro...
Amor, ministro velhaco da maravilhosa Vénus...
Estas pombas tímidas sentiam a sua coragem resfriar-se; deixavam cair languidamente suas asas cansadas...
Cumprimentem de minha parte a rapariga de Polyanacte...
A Aurora de ténis de ouro desponta já no horizonte...
Todas as cores se confundiam no seu rosto...
A lua iluminava um céu cheio...
As estrelas escondem os seus fogos brilhantes na vizinhança da lua: quando perfeitamente arredondado, este bonito astro ilumina a terra...
O sono amolecia as suas pálpebras...
Que os ventos levem a malícia alheia...
Serviços extra a outras amadas fazem-me mais profundas as feridas...
Deliciosa Vénus, enviei-te dos ornamentos da púbere côr púrpera: são deveras preciosos: é a vossa Sappho que te oferece estes agradáveis presentes...
Não a tenho em consideração até a voltar a desejar...
A vossa disponibilidade devolveu-me a integridade...
Não me ocupam somente coisas meticulosas...
Sim é um mal morrer, porque se não fosse desgraça, os deuses teriam morrido há já muito tempo...
Na cólera, nada convem melhor que o silêncio: quando se acalmam os seus transportes é necessário ainda retractar a língua e não nos entregarmos discursos inúteis e empolgados...
Os pais desta jovem beleza guardada com tanto cuidado pretendiam que eu lhe dava morte fazendo discursos sobre o himen...
Monday, July 02, 2007
HETEROPSICOGRAFIA PREFACIAL
Mas se no que minguadamente ou abundantemente escrevinhamos é o quanto nos lêmos, com alguma justificada perplexidade, quer no que parece ser legível, quer nas desfloradas entrelinhas, também o é quanto nos outros nos lemos, ou eles, através do nós, fantasmáticamente nos lêem – e esse é um equívoco, já que a leitura é feroz reconhecimento de uma coisa que em potência fervilha no que habituadamente designamos por alma, mas também é o reconhecimento de um irreconhecivel que parece estar no ar no quanto mundanamente é radical dissimulação. São os pudores das dores e o Amor como negação que temos por mais assegurado. E assim é, o mundo treme debaixo dos firmamentos.
Bem nos podemos entreter com amostras sentimentalonas de razão quanto a tão irrazoável coisa! O que nos leva a ser adverbiais de modo, tão enroladas no querer dizer coisas atrapalhantes, tão directas no acessório, tão perdulárias por excesso de ornamento! – nada parece saír com certidão nas multiplas tentativas a que aqui nos atiramos. Falta-nos a secura dos clássicos e o horror moderno à adjectivação. Também a natura diverge logo na origem, e assim a imitamos na divergência de si mesma, a cada enunciado se escaldando.
Este livro é programáticamente um assenhoramento dos sonetos do Shakespeare, que aqui é traído, ignorado e mal-tratado e outras coisas impróprias. São estes versos postos em boca de mulher, o que não é de estranhar, pois não falta travestismo aos muitos aquis e acolás que se implicam nas feituras e exibições de seus labores. Trata-se de uma apropriação muito cega, e juramos a pés juntas que não sabemos se sobrou sequer um (des)troço que seja fiel a um texto que nunca é original – fidelidades a sentidos estanques são devoção de caniche a megera.
Aquilo a que miserávelmente chamamos literatura pede-nos de joelhos paixões assolapadas que a levem festivamente aos nossos corpos. E nós respondemos particularizando a linguagem, no que é particularizável, tornando ainda mais pessoais os pronomes – o tradutor é um intermediário singularizador, como a mãe que prepara a papa a seu modo. Somos, nesta entrega, umas misticas tão materialistas que só podemos acusar a linguagem de estar a fugir ao corpo de onde nunca poderá escapar senão no grande escapanço da morte.
E assim todolos autores se fazem nossas – amadas mais do que amigas – perdoem-nos os exacerbamentos metafóricos e a vontade, tão grega, de andar a desdizer mal dá azo a isso – é uma inquietude canibal, na qual pomos, sorrateiramente, o máximo dos máximos de delicadeza.